Tudo indica que muito em breve você poderá pedir um carro para levá-lo a uma reunião de negócios ou à balada e, em alguns minutos, encontrar um automóvel sem motorista esperando à porta de sua casa. Quando chegar ao destino, basta sair do veículo e fechar a porta. Nem um “muito obrigado” será preciso dizer. Pesquisas apontam que em cinco ou dez anos essa será uma atividade corriqueira, uma vez que o uso de serviços de transporte com veículos autônomos está se tornando uma das mais fortes tendências de mobilidade para quem deseja se deslocar pelas ruas das cidades de forma rápida, segura e econômica, principalmente em rotas curtas e viagens intermunicipais.

Estudo recente da Associação Internacional de Transporte Público (UITP, do francês L’Union Internationale des Transports Publics) mostra que o caminho para a adoção de veículos autodirigíveis é um dos mais certos no cenário da mobilidade urbana. Batizado de Autonomous vehicles: a potential game changer for urban mobility (ou Veículos autônomos: um potencial divisor de águas para a mobilidade urbana, em tradução livre), o relatório aponta os desafios para tornar os carros autônomos uma opção que mude para melhor o trânsito das metrópoles. O primeiro ponto é garantir que esses novos veículos sejam compartilhados e que as pessoas estejam prontas para a ideia de usar esse modelo de transporte e alternar diferentes meios de locomoção para de fato reduzir os congestionamentos que atravancam as grandes cidades.

Como é comum com a chegada de todo grande avanço tecnológico, as transformações também trazem a reboque mudanças no comportamento das pessoas e, em certas situações, algumas dúvidas. No caso dos veículos autônomos a questão hoje é saber se as pessoas teriam alguma resistência em viajar em carros sem alguém atrás do volante. Essa desconfiança se transformou em susto real quando, em março último, um carro autônomo atropelou e matou uma ciclista na cidade de Tempe, Arizona, nos Estados Unidos. Mesmo assim, estudos mostram que o receio está diminuindo aos poucos, conforme a tecnologia vai sendo mais conhecida. Uma pesquisa realizada pela consultoria Deloitte com 22 mil consumidores de 17 países no início deste ano mostra que 41% das pessoas não confiam nesses veículos. Em 2017, esse índice atingia 67% das pessoas entrevistadas. “A redução da desconfiança é resultado do maior acesso a informações sobre o progresso no desenvolvimento dos carros autônomos”, comenta Carlos Ayub, da Deloitte. Nesse ritmo, claro, é possível afirmar que, com o tempo, as resistências serão ainda menores.

Outro ponto importante será incentivar entre as pessoas o compartilhamento de viagens – tema, aliás, que também se destaca no relatório da UITP. Segundo a entidade, a partir de agora, todas as formas de compartilhamento precisam ser promovidas e estimuladas. Por exemplo, podem-se criar incentivos fiscais para viagens compartilhadas ou propriedade compartilhada de veículos, áreas compartilha das de veículos e campanhas de conscientização, além de promover projetos-piloto com o objetivo de fazer com que haja mais de um passageiro nos veículos. O grande nó a ser desatado, porém, está na interligação entre os diferentes modais, integrando frotas de veículos autônomos como parte de um sistema de transporte público diversificado, que inclua ônibus, trens e metrô. Precisam ser tomadas medidas para limitar a ocupação de um carro, bem como iniciativas para evitar ter carros autônomos privados vazios nas estradas.

Mesmo assim, o futuro parece promissor para quem apostar nas tecnologias envolvidas nesse mercado. Pesquisa da consultoria AT Kearney estima que o segmento de equipamentos especiais – como controles de bordo, sistemas de guias e de comunicação – deve alcançar 103 bilhões de dólares ao ano em 2030. Aplicativos móveis que facilitam a interação entre veículos e auxiliam na comunicação com outros integrantes dessa cadeia – como prestadores de serviços de mobilidade – devem gerar outros 86 bilhões de dólares.

REDUÇÃO DA POLUIÇÃO E DE ACIDENTES

O avanço desse mercado promete trazer também impactos urbanísticos positivos, reduzindo congestionamentos, liberando espaços dedicados a estacionamento e diminuindo a poluição. Um estudo feito pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês) e pela Universidade Cornell, divulgado em 2017, desenvolveu um sistema baseado em veículos autônomos para compartilhamento de viagens que, a partir de um algoritmo, conecta pessoas que desejam fazer deslocamentos urbanos semelhantes. Esse modelo leva em conta algumas premissas básicas importantes, como a capacidade e a rota dos veículos. O objetivo é fazer com que cada carro transporte o maior número de passageiros possível a partir de um trajeto que permita às pessoas chegarem a seus destinos no menor tempo, eliminando um bom número de automóveis das ruas da cidade.

Nesse trabalho, realizado a partir de dados reais extraídos de uma base pública de informações de Nova York, foram avaliados quais seriam os efeitos do uso de algoritmos sobre o tamanho da frota de táxis da cidade, sua capacidade de atendimento, eventuais atrasos, o tempo das viagens dos passageiros e, por fim, os custos operacionais. Entre outros resultados, chegou-se à conclusão de que, ao atingir a eficiência máxima do sistema por meio de compartilhamento em carros autônomos, seria possível substituir os 13 mil carros que fizeram as viagens usadas como base do estudo por cerca de 3 mil veículos, reduzindo drasticamente os níveis de emissão de gases. O levantamento apontou ainda que, para atingir esse mesmo nível de serviço em veículos com capacidade para dez pessoas, seria necessária uma frota de apenas 2 mil carros autônomos. Essa diminuição na quantidade de carros circulando – apesar de improvável no ritmo apontado pelo estudo – permitiria um notável ganho de eficiência em todo o sistema, reduzindo, de forma considerável, os congestionamentos e, ainda, as emissões de poluentes, já que esses veículos são todos movidos a energia elétrica.

Vários estudos realizados nos últimos anos também apontam que, nas próximas décadas, a popularização dos carros e táxis autônomos trará uma enorme redução dos acidentes, já que a maioria deles é causada por falhas humanas. Uma dessas análises, feita pela Boston Consulting Group em parceria com o Fórum Econômico Mundial, indicou que essa redução pode ser de até 90%. A melhor consequência desse avanço, claro, será uma queda espetacular no total de mortes no trânsito.

Estudo divulgado há dois anos pela consultoria BI Intelligence também indica que daqui a alguns anos será mais seguro trafegar pelas estradas. No Reino Unido, por exemplo, a KPMG estimou que até 2030, com cada vez mais carros autônomos circulando, haverá 2,5 mil mortes a menos. Mais recentemente, em janeiro deste ano, nos Estados Unidos, a Administração Nacional de Segurança Rodoviária (NHTSA, na sigla em inglês) passou a pedir sugestões às pessoas e às empresas ligadas ao setor sobre como definir melhor as regras de segurança para automóveis autônomos. Os apoiadores dessa nova tecnologia acreditam que ela poderá ser muito útil para reduzir as 35 mil mortes que acontecem nas rodovias norte-americanas todos os anos.

CARROS VOADORES

Carlos Ayub, da Deloitte, ressalta que os veículos que dispensam os motoristas ainda estão em fase experimental, mas apresentam expectativas bem promissoras. “A indústria está diante de um longo ciclo de investimento de capital necessário para transferir a tecnologia dos veículos autônomos ao mercado convencional. É importante que as montadoras continuem a destinar recursos para o desenvolvimento e a incorporação da tecnologia de condução autônoma”, analisa Ayub. Para ele, as empresas que não acreditarem na necessidade de se preparar para as mudanças de longo prazo que se desenham no mercado automobilístico estarão mais expostas a riscos, na medida em que a aceitação do consumidor pela tecnologia autônoma tende a avançar.

Apesar dos investimentos e dos obstáculos tecnológicos, o momento é desafiador para todos os agentes desse mercado, incluindo as montadoras. “É um caminho sem volta. Oferecer soluções de mobilidade para as grandes cidades também é uma responsabilidade do setor automobilístico”, diz Marco Silva, presidente da Nissan do Brasil, uma das empresas que, no Japão (país de origem da montadora), têm realizado diversos testes com veículos autônomos.

As novidades que devem revolucionar a mobilidade urbana não param no setor automotivo. No ano passado, a francesa Airbus, uma gigante no setor de fabricação de aviões, apresentou em Genebra o Pop.Up, um carro elétrico voador desenvolvido em parceria com o estúdio de design automotivo Italdesign. “Nos próximos anos, o transporte terrestre deverá subir ao próximo nível. Além de ser compartilhado, conectado e autônomo, será também multimodal em direção à terceira dimensão”, afirmou Jörg Astalosch, CEO da Italdesign, na ocasião do anúncio.

Veículo sem motorista

Conheça algumas tecnologias indispensáveis para que o carro autônomo trafegue com segurança:

Sempre alerta
Sensores de alta precisão detectam objetos fixos e móveis e medem sua distância em relação ao veículo.

Radares de longo alcance
Observam a aproximação de outros veículos e calculam suas velocidades.

Visão total
Esses instrumentos são os olhos do veículo, pois detectam, em fração de segundo, espaços livres, cruzamentos, pedestres, ciclistas, sinais e placas de trânsito.

Radares articulados
Percebem veículos em movimento a longa distância e permitem antecipar manobras.

Radares de curto alcance
Detectam objetos próximos fora do alcance da visão periférica.