Grande parte dos problemas vividos pela saúde pública no Brasil está relacionada às deficiência na gestão. Uma saída para isso, de acordo com Yussif Ale Mere Jr., presidente do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (Sindhosp), seria a ampliação e o fortalecimento das Parcerias Público-Privadas (PPPs).
Para Mere Jr., o governo é um mal gestor não apenas na saúde, mas também em portos, aeroportos, e outros serviços. “O governo brasileiro, quando presta um bom serviço, o faz com um custo muito alto. Mas na maior parte das vezes ele não presta um bom serviço”, diz. Por conta disso, Mere Jr. defende a adoção de políticas que viabilizem a expansão das PPPs na saúde com medidas simples, tais como permitir e estimular o consórcio entre municípios para viabilizar unidades hospitalares regionais operadas neste sistema; flexibilizar o limite de comprometimento orçamentário para hospitais em PPP com gestão integral, além de oferecer incentivos fiscais de forma a baratear a contraprestação final. Os ganhos efetivos que o modelo oferece contribuirão de forma decisiva para melhorar a prestação de serviços de saúde à população mais carente.
“Nós acreditamos que o governo teria que se especializar em regular. Ele deve fazer a regulação, com isenção, e deixar o resto com a iniciativa privada”, afirma. Para o presidente do Sindhosp, o tamanho do governo não cabe mais no PIB brasileiro, o que por si só justificaria a ampliação das PPPs.
De todo modo, Mere Jr. avalia que o Brasil não conta com poucas parcerias na área da saúde. Ele lembra que a iniciativa privada atende grande parte da saúde pública brasileira via SUS. Nesse grupo estão também as Santas Casas e as clínicas oncológicas privadas que fazem tratamento público. “Isso é PPP, porque é o governo que está pagando por isso”, diz.
O que falta, na opinião do presidente, é que União, Estados e municípios entendam essa relação e trabalhem juntos para que os ressarcimentos do SUS sejam condizentes com os custos. Isso passa, por um lado, pela atualização dos valores pagos pelo SUS e, de outro, por um esforço conjunto para a redução dos custos.
Sobre a redução, Mere Jr. defende uma revisão na gestão plena de saúde concedida aos municípios pela Constituição de 1988. Ele lembra que o Brasil tem 5.570 municípios e, destes, 3.700 têm menos de 20 mil habitantes. Há ainda cerca de mil cidades com populações entre 20 mil e 50 mil habitantes. “Cidades desse tamanho não têm estrutura nem volume de atendimentos. Por exemplo, não é viável ter um hospital que faça apenas 10 partos por semana, mas muitos prefeitos fazem questão de tê-los e não aceitam mandar pacientes para as cidades vizinhas”, compara.
A solução, aqui, seria devolver a administração de saúde dessas cidades para o âmbito do Ministério da Saúde, que seria o responsável por construir uma rede de atendimento com a participação da iniciativa privada. “Existe a possibilidade de que isso ocorra porque todos estão percebendo isso. Isso é mandatório para se reduzir custos”, ressalta.
A receita prescrita por Mere Jr. prevê também a construção de redes inteligentes de saúde e a integração dos atendimentos e dados em todos os níveis. “Já passou da hora de a gente informatizar tudo isso”, defende.
Bom exemplo
Um exemplo bem-sucedido de Parceria Público-Privada na área da Saúde é o Hospital do Subúrbio (HS), em Salvador. Considerada a primeira unidade hospitalar viabilizada por meio de PPP no Brasil, o hospital tem foco em atendimentos de urgência e emergência e é operado pelo consórcio Prodal Saúde S.A., contando com centro de bioimagem, raios-X, tomógrafo, ultrassonografia, ressonância magnética e endoscopia, entre outros.
A construção da unidade, realizada pelo Estado, exigiu o investimento de cerca de R$ 54 milhões. Já os investimentos do parceiro privado para equipar e iniciar os atendimentos foram de, aproximadamente, R$ 36 milhões. Seguindo a regionalização pregada por Mere Jr., o hospital atende cerca de 1 milhão de habitantes de todo o subúrbio, além da população de bairros como Valéria, Cajazeiras, Castelo Branco e Pau da Lima e municípios da Região Metropolitana de Salvador (RMS).
O hospital passou a contar com 373 leitos a partir de março de 2012, sendo 60 em internação domiciliar, e se destina ao atendimento de alta complexidade para crianças e adultos, especificamente urgências e emergências clínicas, cirúrgicas e traumato-ortopédicas. Inclui, ainda neurocirurgia e endoscopia digestiva. O prazo da concessão será de dez anos e a remuneração da concessionária se dá unicamente por meio de contraprestação pública.
A PPP do Hospital do Subúrbio é do tipo administrativa e conta com um modelo integral de gestão privada, em que a concessionária é responsável tanto pela gestão predial (serviços não assistenciais) quanto pelo atendimento médico aos usuários. Essa modalidade é conhecida como gestão “bata branca” (assistência hospitalar à população pelo concessionário). Já nos casos de “bata cinza”, a responsabilidade do setor privado restringe-se à gestão predial (engenharia clínica), limpeza, manutenção, segurança, recepção, entre outros), com a assistência médica hospitalar permanecendo sob a responsabilidade do Estado. No final do contrato, todos os bens que integram a estrutura do local serão revertidos ao Governo do Estado da Bahia.
Um estudo realizado pelo Instituto Semeia demonstra que o hospital conquistou a satisfação quase unânime dos usuários. Mais de 90% dos pacientes estão satisfeitos com os serviços prestados. Quando perguntados se voltariam ao Hospital em outra necessidade, 92% dizem que sim. Para 96% dos pacientes, a necessidade que os levou até o local foi atendida. No segundo trimestre de funcionamento, o HS superava parte dos indicadores qualitativos presentes no contrato. A taxa de reingresso na UTI, por exemplo, de no máximo 2,3%, ficou em 1,1%, e a taxa de mortalidade por acidente vascular cerebral, de no máximo 7,4%, foi de 3,69%.
No HS não se veem pacientes deitados em macas ou colchonetes espalhados pelos corredores, como é costumeiro em hospitais públicos. Os quartos da enfermaria normalmente recebem no máximo três pacientes. Em geral, os resultados dos exames saem no mesmo dia em que são realizados. Os equipamentos de diagnóstico por imagem, como ultrassonografia e tomografia, são de última geração. Como a manutenção tem de ser feita pela concessionária, fica mais fácil chamar a assistência técnica para consertar as máquinas, pois não é preciso fazer licitação. Isso também facilita a compra de insumos básicos, como soro fisiológico, seringas e algodão.
Os médicos e funcionários administrativos são contratados pela concessionária, não pelo Estado. Não têm estabilidade e, por isso, podem ser substituídos a qualquer hora, se não tiverem bom desempenho. Mesmo com qualidade superior nos atendimentos, em 2012 os serviços do Hospital de Subúrbio custavam menos aos cofres públicos do que os oferecidos pelo Hospital Geral do Estado, para onde até então eram encaminhados os casos de urgência e emergência de Salvador.
O sucesso das operações do Hospital pode ser comprovado também pelo reconhecimento nacional e internacional do projeto. Além da inserção na lista da consultoria KPMG, o HS recebeu o título de um dos dez melhores projetos de PPP na região da América Latina e Caribe pelo Banco Mundial/IFC. Em termos de certificação, o HS foi a primeira instituição pública do Norte e do Nordeste a receber o Certificado de Acreditação, da Organização Nacional de Acreditação, que comprova qualidade do atendimento prestado. Atualmente, possui acreditação ONA nível 2.
O HS em números
R$ 54 milhões foi o investimento público na construção do prédio
R$ 36 milhões foi o investimento do concessionário no aparelhamento do Hospital
10% é quanto o custo do HS é inferior aos hospitais administrados diretamente pelo Estado
R$ 150 milhões é o pagamento anual ao concessionário pela gestão e operação do Hospital