Medida Provisória 703

Entenda as regras que pretendem facilitar os acordos de leniência no Brasil

A opinião das entidades de classe

Entidades empresariais e de trabalhadores, ligadas sobretudo a setores atingidos pelas investigações da Lava Jato, vieram a público defender a MP 703, regulamenta os acordos de leniência. Algumas, inclusive, trabalharam ativamente para sua aprovação. Para elas, apesar de ainda imperfeita, a medida é um primeiro passo para que seja destravado o nó que paralisa investimentos em diferentes setores.

O principal argumento de defesa é que as empresas e seus empregados não podem sofrer por atos criminosos de seus controladores e precisam continuar existindo. É uma prática comum em outros países, que têm em suas empresas verdadeiros símbolos de sua pujança econômica. Para os críticos, a medida precisa ser corrigida em muitos pontos. Um deles é relaxar excessivamente as penas a serem impostas a muitas empresas, além dos limites praticados em outros países. Para todos, é importante a partir de agora acirrar as discussões em torno da medida, sobretudo no Congresso. O objetivo é fazer com que a lei que irá substituir a MP seja a mais completa possível.

DEPOIMENTOS:

Foto: José Paulo Lacerda/CNI

Foto: José Paulo Lacerda/CNI

Cassio Borges
Gerente-executivo jurídico da da CNI – Confederação Nacional da Indústria

“A Lei Anticorrupção tem dois propósitos: um pedagógico e outro de reaver os valores públicos mal utilizados. Vindo a ser celebrado, o acordo de leniência permite que os objetivos da norma sejam atingidos. De maneira geral, a MP é positiva na medida em que traz para o âmbito do acordo a atuação de autoridades, como o Ministério Público e Tribunal de Contas da União, que até então tinham posições indefinidas. A MP também deixa claro que é possível trazer para o acordo vários fatos que poderiam estar relacionados como punições, atreladas àquela pessoa jurídica. Outro ponto positivo é o fato de ela não fazer a confusão de trazer a pessoa física para a seara da pessoa jurídica. Defendemos a preservação das empresas, dos empregos e do recolhimento dos tributos. Punindo quem tem de punir. A solução não é o encerramento das instituições. A medida permite a retomada do crescimento econômico brasileiro, em função do momento difícil que atravessamos porque traz mais segurança e torna mais exequível o cumprimento da legislação.”

Foto: Divulgação ABIMAQ

Foto: Divulgação ABIMAQ

Cesar Prata
Presidente do Conselho de Óleo e Gás da Abimaq

“A Abimaq participou da elaboração da MP 703 porque percebeu a urgência em permitir que as empresas envolvidas nos grandes escândalos pudessem conduzir a parte criminal de maneira separada da administração de seus negócios. As empreiteiras envolvidas na Lava Jato são tão grandes, com obras em setores tão variados, que a investigação afetou todos os outros contratos, inclusive em áreas muito diferentes das que estavam sendo investigadas. As empresas não podem ser impedidas de continuar as obras porque isso gera um desemprego imenso em cadeia. A Petrobras parou de pagar as empreiteiras, elas pararam de nos pagar e nós paramos de pagar fornecedores e governo. Em outros países, essa separação já é uma realidade. Lá, há instrumentos previstos em lei, a empresa troca de mãos e toca-se a vida. Não há desemprego em massa como aqui. Outro aspecto importante é o da perda de tecnologia.
As empreiteiras concentram engenharia e conhecimento técnico. Tememos que, se continuarmos punindo as empresas, pelo crime que seu dono cometeu, percamos a engenharia brasileira.”

Foto: José Cruz/Agência Brasil

Foto: José Cruz/Agência Brasil

Vagner Freitas
Presidente Nacional da CUT – Central Única dos Trabalhadores

“O combate à corrupção é uma questão de princípio para a CUT. Nós sempre lutamos contra a corrupção e defendemos que toda denúncia seja apurada de forma profunda, transparente e democrática. Isso, no entanto, deve ser feito sem prejuízo ao processo de desenvolvimento econômico e social do País e sem a destruição das empresas e de milhares de postos de trabalho. Investigar e punir culpados não significa fechar empresas e provocar desemprego em massa, afetando milhares de trabalhadores e trabalhadoras, suas famílias e a economia do Brasil. Nem a empresa, nem a classe trabalhadora devem pagar pelos crimes cometidos pelos executivos. É justamente para não afetar a economia e preservar os empregos que a CUT é favorável à realização dos acordos de leniência. Não entendemos a razão de tanta demora em implementar essa legislação, que existe em vários países do mundo, no Brasil.”

Foto: Divulgação

Foto: Divulgação

Bebeto Galvão
Presidente do Sintepav – Sindicato dos Trabalhadores da Construção Pesada e Montagem Industrial e deputado Federal pelo PSB-BA

“O Brasil já constituiu uma Lei Anticorrupção, que foi uma conquista da sociedade. Não podemos permitir que haja desuso dessa lei para benefício de um empresário. Mas é preciso separar o erro de um indivíduo da empresa, que é maior do que ele. Há exemplos na Alemanha e na Holanda em que o empresário é alcançado, responsabilizado, mas a empresa continua. Quem for podre que se arrebente. Empresas não são o CPF de um ou outro diretor. Ela se constitui de milhares de trabalhadores, de geração de tributos, de know how técnico. Não é possível penalizar todo o Brasil, queimando milhares de empregos. Não podemos esperar muito mais tempo. A MP pode servir de base para uma grande discussão sobre o tema e o Parlamento poderia dar uma demonstração de responsabilidade com os interesses nacionais, já que ela precisa ser transformada em lei e solucionar o problema que não é de uma empresa ou de outra, mas de todo o Brasil.”

Foto: Fernando Alvim/Clube de Engenharia

Foto: Fernando Alvim/Clube de Engenharia

Pedro Celestino
Presidente do Clube de Engenharia

“O combate à corrupção nos une a todos. Essa prática se mantém no País há décadas, atingindo proporções intoleráveis. Punir não significa apenas pagar multa, mas mudar a forma de dirigir, de conduzir a governança, de se submeter a controles externos e separar administração da propriedade. Apesar de necessário, porém, esse combate não pode levar à destruição das empresas e dos empregos. Há vários mecanismos a serem aperfeiçoados que permitem sua sobrevivência. Recentemente tivemos o caso da Volkswagen, que está pagando multas milionárias na Alemanha. A Alemanha vai deixar a Volkswagen quebrar? Ela gera receitas, é símbolo da capacidade alemã. O Goldman Sachs, há 15 dias, fechou um acordo de US$ 5 bilhões nos EUA. Tem dirigentes processados, o banco foi multado, mas ele é necessário à economia americana. O que dói no bolso muda comportamentos e cria mecanismos de proteção do estado e do dinheiro público. Corrupção existe, mas pelo menos institucionalmente cria mecanismos de controle.”