Desafios

27 de setembro de 2017

“Setor de abastecimento precisa mudar a lógica”, defende especialista

As disrupções não pouparão nenhum setor, mesmo os mais tradicionais como o de abastecimento. O diagnóstico foi publicado este ano pela Accenture num relatório que aborda a necessidade de reação rápida das empresas que fornecem petróleo e gás.

Basicamente, essas companhias se acostumaram a cortar custos durante recessões e, por outro lado, aumentar significativamente os gastos em períodos de bonança para produzir ainda mais. Mesmo com a flutuação de preços, essa lógica funcionava porque, no fim do dia, o petróleo era um produto caro e indispensável.

“Questões ligadas principalmente a mudanças climáticas, veículos elétricos e à demanda levaram a um choque de preços e uma volatilidade bem maior”, explica Daniel Rocha, diretor executivo da Accenture e especialista em indústria de energia. “Esse novo cenário exige mais competitividade e transformação, porque as margens tendem a ser cada vez mais baixas.”

“Os líderes se acostumaram a trabalhar em contextos onde o preço sempre crescia, com um barril de petróleo chegando a custar US$ 100. Era um produto escasso e cada vez mais caro. O cenário se inverteu”, diz Adilson Oliveira, consultor da Accenture que também assina o relatório.

Ainda assim, essa cultura antiga se perpetua, tanto que dificilmente se pensa em otimizar custos. A receita para seguir no topo passa justamente por melhorar a gestão financeira, imitando um pouco o pensamento que pauta o varejo – o zero-based budgeting, ou seja, o orçamento começa do zero e cada despesa precisa ser justificada naquele momento para entrar na conta. “É o mindset de pensar a organização a partir do zero, algo já maduro em outras indústrias”, afirma Daniel.

Outra estratégia passa por colocar a inovação em pauta. As tecnologias digitais podem levar a reduções de gastos significativas e perenes. Analytics, big data, visualização de dados em tempo real, business intelligence e inteligência artificial são algumas das ferramentas que podem ajudar a cortar custos onde se deve, e não onde se acredita que deve.

“Por outro lado, investir em IoT (Internet of Things – Internet das Coisas) permitirá que equipamentos gerem e transmitam dados, ajudando a entender a operação de forma profunda. É daí que podem sair insights importantes sobre as principais alavancas de custo”, diz o executivo.

Vale ainda pensar em drones para o transporte de peças e equipamentos e operação remota, avanços já aplicáveis e com potencial de impactar em 20% a 30% as despesas de operação e em 10% a 20% as despesas de capital, segundo a Accenture.

O pré-sal fracassou?

Para o executivo da Accenture, o Brasil perdeu uma grande janela de oportunidade ao rever o modelo de concessões para operar o pré-sal. “A transformação regulatória não era imprescindível, mas foi feita, e implicou em que uma única empresa seria líder absoluta dos investimentos e da operação em áreas estratégicas, mesmo sem fôlego para ser a única protagonista. Perdeu-se o senso de urgência.”

O resultado é que, hoje, com o preço do petróleo bem menor, a disposição da indústria é mais tímida e o clima de otimismo foi substituído por uma grande frustração. “Se ainda quisermos aproveitar, devemos ter uma agenda constante de leilões, com a entrada de vários operadores e investimento em eficiência para monetizar esse ativo e transformá-lo em valor real para a sociedade”, diz Daniel. “Há dez anos, quando o pré-sal foi descoberto, a estrutura de custos podia ser alta pela expectativa de aumento no preço. Mas isso não é mais verdade. É hora de acordar”, complementa Adilson.

Ver comentários