Jornada da Sustentabilidade

Produção

Estadão Blue Studio

Uma jornada estratégica para um sistema financeiro mais resiliente e eficiente

A adoção de regulamentações alinhadas às melhores práticas internacionais impõe desafios relevantes às instituições locais

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29 de maio de 2025

A chegada das práticas da Fundamental Review of the Trading Book (FRTB) ao País ­­– dentro do conjunto de recomendações do Comitê de Basileia (BCBS), conhecido como Basileia III, do qual o Banco Central (Bacen) é membro e responsável pela convergência local – tem o objetivo de modernizar a forma como as instituições financeiras calculam o capital mínimo necessário para cobrir os riscos de suas operações de tesouraria.

O FRTB é uma resposta à necessidade de metodologias mais precisas e consistentes para o cálculo do capital regulatório em todo o mundo. A proposta é garantir que bancos e outras instituições financeiras possuam reservas adequadas para enfrentar as volatilidades inerentes às atividades de negociação, aumentando a resiliência em cenários de crise e aprimorando a sensibilidade aos riscos.

Ao adotar políticas semelhantes às aplicadas aos bancos globalmente, a gestão de risco de mercado no Brasil se moderniza, impulsionando a resiliência do Sistema Financeiro Nacional.

Terceira de quatro fases

A adoção das novas regras pelos bancos que operam no País segue um cronograma estabelecido pelo Bacen em quatro fases. Atualmente, encontra-se na terceira fase, que terá sua vigência a partir de janeiro de 2027.

As normas exigem grandes aprimoramentos na gestão, nos controles internos e na transparência dos relatórios de risco e, por isso, representam desafios significativos para os bancos, de acordo com Denis Eduardo Pereira, sócio de Regulatory & Financial Risk da Deloitte, a organização com o portfólio de serviços profissionais mais diversificado do mundo.

De acordo com o executivo, no final de abril de 2025, o Bacen publicou a Resolução número 470, estabelecendo os procedimentos para o cálculo dos ativos ponderados pelo risco (RWA SENS) para risco de mercado, mais especificamente nas operações da carteira de negociação.

Tal resolução representa um avanço fundamental na busca por um modelo de gerenciamento de risco mais granular, sensível e alinhado às práticas globais (ainda em implementação pelo mundo), sendo um pilar central da Fase 3. “O processo de cálculo consiste na identificação de instrumentos financeiros, mapeamento de fatores de risco e cálculos de sensibilidades, agregados por processos de consolidações com o uso de correlações. Essa medida incentiva a formação de portfólios dinâmicos e mais diversificados. É um tema complexo, com impactos relevantes do ponto de vista da implementação”, destaca Pereira.

Desafios da nova regulamentação

Além da implementação em si, o movimento vai exigir das instituições uma revisão ampla de seus sistemas internos, processos e estruturas, investimentos em qualidade de dados, capacitação de equipes e padrões mais rígidos de governança, entre outros pontos. A obrigatoriedade se estende aos chamados bancos dos segmentos S1 a S3.

Pereira explica que, para facilitar a adoção de novas regras e adequá-las ao mercado local, o Bacen por meio da Resolução 4.553/2017 classificou as instituições financeiras brasileiras em cinco níveis ou segmentos (de S1 a S5), considerando aspectos relacionados ao porte e ao nível da atividade internacional das instituições como fatores para a segmentação. Ele explica que isso permitiu a proporcionalização dos efeitos dos normativos, ou seja, as regulamentações são as mesmas, porém a exigência vai se abrandando à medida que a instituição financeira é menos relevante do ponto de vista do risco sistêmico. Os bancos S1, por exemplo, são as maiores instituições do País. A lista de qual instituição faz parte de cada grupo pode ser consultada aqui.

“Os bancos S1 têm de seguir automaticamente todas as recomendações de Basileia, por conta do tamanho e da impossibilidade de quebra (“To big to fail”), e já trabalhavam com o normativo original da Basileia há algum tempo”, conta o executivo. “Agora com a publicação oficial do Banco Central esses bancos precisarão ajustar-se às convergências locais. Por outro lado, os bancos S2 e S3, que são os bancos médios, terão um desafio ainda maior, dado que deverão implementar todo o arcabouço regulatório e, por isso, estimamos que o impacto operacional será muito grande. Todavia, com o término do prazo definido pelo regulador como janeiro de 2027, entendemos que a implementação é mais do que factível, desde que não se deixe para a última hora, como infelizmente vimos na implementação da Resolução 4.966/21 e que impactou fortemente as publicações dos bancos.”

Para que tudo opere de forma suave e a implementação ocorra sem atritos, um dos principais pontos nos quais as instituições devem investir é na qualidade de seus dados – identificando adequadamente as fontes de informações em diferentes sistemas internos e externos, uma vez que, para o atendimento ao normativo, adicionalmente às tradicionais informações de parâmetros de mercado, será necessária a captura de informações sobre emissões de títulos, como rating, senioridade, setor econômico, entre outros. Dados inconsistentes, desatualizados ou pouco granulares comprometerão a apuração do RWA SENS e aumentam o risco de não conformidade.

Outro passo é revisar a arquitetura operacional, de modo a identificar a necessidade de upgrade de infraestrutura (como cloud, servidores e sistemas analíticos), além de investir, tanto quanto possível, na automatização dos fluxos de cálculos, validações e reportes. Isso é fundamental não só para evitar erros, mas para que os prazos sejam cumpridos.

O especialista da Deloitte ressalta ainda a importância de uma governança robusta e bem documentada, com registros detalhados sobre fontes de dados, metodologias, parametrizações, testes e validações. A rastreabilidade completa dos componentes de cálculo será mandatória.

A qualificação dos times de risco, TI, modelagem e reportes será essencial para que garantam a operação dentro das novas regras.

Ganhos esperados

O executivo comenta que a nova metodologia consegue trazer maior e melhor alinhamento entre quem controla o risco e quem gera o risco. Trata-se de um benefício para o mercado – por conta da padronização entre bancos brasileiros e mundiais, permitindo maior comparabilidade entre as diferentes jurisdições.

Em suma, a implementação do FRTB trará mudanças substanciais, baseada em uma nova metodologia de cálculo que busca um retrato mais fiel à forma como os riscos são geridos, bem como incentivando sua gestão de modo muito mais ativo.

Fases da implementação

A implementação do FRTB no Brasil já apresenta duas fases em vigência:

  • A primeira, vigente desde 2021, contemplou as regras de classificação das operações em carteiras bancárias e de negociação, aspectos de governança e estrutura das mesas de operação (BCB 111/21).
  • A segunda fase, iniciada em 2024, compreendeu o cálculo diário do capital requerido para as exposições ao risco de crédito dos instrumentos financeiros classificados na carteira de negociação (BCB 313/23 – DRC) e que já está em vigor desde julho de 2024.

Próximos passos

Com a publicação do normativo referente à implementação do RWA Sens, ou seja, da terceira fase, que passará a vigorar em janeiro de 2027, o Bacen deve começar a fomentar a discussão sobre as últimas etapas referentes à implementação do FRTB (ainda sem data definida).

Nessas próximas fases são esperadas as definições dos seguintes normativos:

  • O primeiro para a definição e autorização de uso de modelos internos para o cálculo do requerimento de capital de risco do mercado;
  • O segundo referente ao simplified standardised approach, modelo simplificado padronizado (tradução livre), que possivelmente será implementado para as instituições de menor porte.

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