Compartilhe
14 de agosto de 2024
As novas normas que padronizam os relatórios de sustentabilidade e ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança) e para o mercado vêm provocando discussões entre a maioria das empresas brasileiras de capital aberto para avaliar a antecipação da adoção das normas aprovadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Um estudo feito pela Deloitte – organização com o portfólio de serviços profissionais mais diversificado do mundo – em conjunto com o Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (IBRI) revelou que 51% das empresas respondentes planejam fazer essa adoção antes de 2026. O número chega a 68% no caso das companhias de capital aberto. Foram ouvidas 51 empresas, das quais 37% são listadas na B3 (Brasil, Bolsa, Balcão) e 18% em bolsas internacionais, com 27% apresentando receita líquida acima de R$ 5 bilhões.
Existem, no entanto, alguns desafios gerais a superar nessa jornada, mostrou o levantamento. Entre os principais deles, os investimentos associados (53% apontam o tema como entrave), a identificação mais eficiente das métricas relevantes (para 51%) e como conectar os relatórios de sustentabilidade e de ESG com as demonstrações financeiras (67% das empresas apontam isso como dificuldade).
Entre os principais pontos de dificuldade que as empresas dizem prever especificamente quanto ao desenvolvimento de relatórios, foram citadas a falta de padronização de dados (60% das empresas respondentes), as informações pulverizadas (58%), a dificuldade de mensurar impactos financeiros (52%) e a falta de equipe especializada (42%).
Ganhos e estruturação
Apesar desses desafios, as empresas esperam ganhos a curto prazo. Os principais benefícios das novas normas para o reporte de informações de sustentabilidade e ESG são: a maior clareza e comparabilidade entre relatórios (para 73%), o auxílio no desenvolvimento de políticas de controle (64%), e mitigação de riscos como greenwashing (declarações enganosas ou exageradas sobre as próprias práticas ambientais) e outras práticas (51%).
As organizações vêm investindo cada vez mais na estruturação de suas respectivas áreas de Relações com Investidores (RI) – que, por sua vez, vêm ganhando importância estratégica na criação de valor para o negócio e no planejamento de dados para um crescimento sustentável. Ter uma área de RI funcional já é realidade entre 76% das empresas que participaram da pesquisa (e 51% delas, evidenciando a importância crescente do tema, criaram essa área nos últimos cinco anos).
Outro aspecto que vem ganhando bastante força nas empresas é a presença de especialistas nos temas de sustentabilidade e ESG. O estudo identificou que 57% das empresas possuem um comitê responsável pelas iniciativas, enquanto 30% já contam com profissionais especializados. Pode parecer pouco, mas 22% afirmam que vão contratar profissionais com esse perfil nos próximos anos. São esses profissionais os responsáveis por estabelecer métricas de acompanhamento das iniciativas, comunicar os objetivos das ações adotadas, avaliar temas materiais e incorporar essas pautas em todas as áreas de negócio, posicionando o tema como estratégico.
Novas tecnologias
O estudo inclui uma análise sobre a comunicação com investidores – fundamental na divulgação dos relatórios – e sobre a adoção de novas tecnologias, também vista como essencial para que as empresas avancem na incorporação das novas normas.
Mais da metade das empresas considera a adoção de novas tecnologias uma prioridade. Porém, apenas 17% já implementam alguma ferramenta de inteligência artificial (IA) e/ou inteligência artificial generativa (GenAI) em suas atividades. No entanto, 35% planejam adotar a ferramenta no próximo ano, refletindo uma tendência de modernização e inovação na área, com o objetivo de transformar a comunicação com investidores e aprimorar a eficiência e a capacidade de resposta às mudanças do mercado.
Essas ferramentas estão presentes em atividades como leitura e análise de dados (em 50% das empresas que já se valem das tecnologias), produção de relatórios (38%) e personalização de conteúdo (25%).
O uso da IA e da GenAI também tem contribuído significativamente com os profissionais de RI na elaboração dos relatórios, economizando tempo e recursos, fornecendo informações e insights mais eficientes e relevantes para os investidores. Os principais ganhos são: automação e sofisticação na construção de relatórios com análise de dados avançados (81%), análise financeira mais aprofundada (69%), e elaboração de comunicação com investidores (63%).
No estudo, foram mencionadas também dificuldades relativas ao tema, sendo a principal delas a necessidade de investimentos em capacitação e de transparência e segurança de dados. “Embora existam desafios significativos, como a adaptação às novas normas, a capacitação em novas tecnologias e a integração dos relatórios financeiros aos de sustentabilidade, as organizações estão comprometidas em superar esses obstáculos para colher os benefícios de forma mais eficiente e transparente para seus investidores”, analisa Reinaldo Oliari, sócio de Audit & Assurance da Deloitte. “A crescente importância das iniciativas ESG, combinada com o uso de IA e GenAI, destaca a necessidade de uma governança robusta e estratégias de comunicação inovadoras para maximizar o valor e a sustentabilidade das empresas”, acrescenta o especialista da Deloitte.
Para Rodrigo Lopes da Luz, conselheiro fiscal do IBRI, “as áreas de Relações com Investidores estão cada vez mais alinhadas com as demandas por transparência, inovação tecnológica e engajamento em questões ESG. A tendência de modernização é evidente, com muitas empresas já adotando ou planejando incorporar IA e GenAI para aprimorar a análise de dados e a comunicação com investidores”.
Comunicação
Comunicar aos investidores as boas práticas de ESG e de sustentabilidade é necessidade das empresas, que vêm buscando inovar, inclusive por causa da relevância crescente dos investidores pessoas físicas, que muitas vezes usam redes sociais para se informar sobre economia e investimentos. Também faz parte desse esforço a valorização de lives e teleconferências.
Para 55% das empresas participantes da pesquisa, o aumento de investidores pessoas físicas deve-se à presença dos “finfluencers” – influenciadores digitais do mercado financeiro –, que atuam como formadores de opinião e referências populares sobre o mercado financeiro. Já 18% disseram discordar disso.
Apesar da divergência, 82% das empresas concordam que a CVM e a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) devem adotar regulações mais rígidas para mediar a relação entre finfluencers e investidores, principalmente no que diz respeito à comunicação clara de riscos para os iniciantes.
“A presença crescente de investidores pessoas físicas e a influência dos finfluencers ressaltam a necessidade de uma comunicação mais acessível e regulada, que promova a educação financeira e a proteção dos investidores. Assim, o setor se posiciona como um pilar essencial para a sustentabilidade e o crescimento das empresas no cenário atual”, aponta Luz, do IBRI.