Em 2012, a população brasileira com 60 anos ou mais era de 25 milhões. Em 2017, superou a marca dos 30 milhões – ou seja, o número de idosos cresceu 18% em cinco anos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Características dos Moradores e Domicílios, divulgada em abril pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Também segundo o IBGE, de 1940 a 2016, a expectativa de vida dos brasileiros ao nascer aumentou em mais de três décadas, e hoje é de 75,8 anos. Essas estatísticas servem de alerta quando se pensa em previdência, pública ou privada. Como garantir renda para o futuro, considerando que se vive mais e que ter 60 anos não significa, necessariamente, parar de trabalhar? E como se preparar em um contexto em que a reforma previdenciária está no horizonte?

“O financiamento da longevidade é o grande desafio da primeira metade do século 21. Não será a produção de alimentos, a interação com a tecnologia ou a distribuição de renda”, afirma Nilton Molina, presidente do Instituto de Longevidade Mongeral Aegon. Ele recorre à própria trajetória para dimensionar a questão: “tenho 82 anos e trabalho todos os dias. Não passa pela minha cabeça parar enquanto tiver autonomia”, diz. “Aquele conceito do descanso, de ficar em casa esperando a sociedade ou o Estado nos remunerar, acabou. Mas se pensa pouco sobre isso.”

Para o especialista, é preciso encarar a necessidade de prover renda desde cedo. “Por mais que se possa trabalhar a vida toda, os longevos precisarão ser realocados e absorvidos pelo mercado. Ainda não sabemos se isso será possível. Além disso, o governo não terá como pagar aposentadorias como faz hoje. Por outro lado, os descendentes, em menor número, se comparados ao passado, precisarão prover a si mesmos, e não aos pais [a taxa de fecundidade em 2018 é de 1,77 filho por mulher, de acordo com o IBGE, contra 6,3 filhos em 1960]. A saída é poupar desde o primeiro emprego.”

Investimento no futuro

A mudança na mentalidade é o primeiro passo, e ela passa por não encarar a poupança como despesa.  “Se ganha R$ 100, tem de separar R$ 10 e guardar. O salário é R$ 90. Entender isso representa uma quebra de paradigma, sobretudo porque trocar o carro ou a TV quando sobra é muito mais lúdico. Mas só poderá se dar ao luxo de trabalhar menos, pensando em renda principal e acessória, quem poupar ao longo da vida”, afirma o especialista.

Mauro Guadagnoli, superintendente comercial da Brasilprev, líder do setor em ativos sob gestão e arrecadação total, compartilha dessa percepção. “Para as pessoas serem ativas e realizadas no período pós-laboral, precisam estar despreocupadas com a vida financeira. Isso exige fazer o dever de casa, mesmo em um cenário onde essa cultura não existe, como é o caso do Brasil [o especialista menciona estudo feito em julho pelo Banco Mundial, segundo o qual apenas 11% dos brasileiros guardam dinheiro para a velhice].”

Apesar da pequena parcela de poupadores, existem movimentos consolidados, como o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), principal motor de crescimento da previdência privada no País, criado para quem opta pela declaração simplificada do Imposto de Renda. “Vivemos a segunda onda de formação de colchão de liquidez, que acreditamos ser fundamental para quem quiser manter hábitos de consumo e até mesmo sobreviver.”

Para os dois experts, as discussões em torno da reforma previdenciária são positivas, mesmo ainda sem norte definido. “Isso fez com que as pessoas começassem a se dar conta de que a aposentadoria tradicional talvez seja insuficiente.”

O cliente em primeiro lugar

Como evitar o conflito de interesses?

Quando se trata de planejamento financeiro, a ética é fundamental, sobretudo quando o tema é previdência. Isso porque os investimentos terão retorno em longo prazo e, se existe conflito de interesses em alguma etapa, o cliente sofrerá com resultados ruins, que carregará por muitos anos. “Para escapar dessa armadilha, quem contrata o serviço precisa confirmar se o planejador financeiro tira do caminho ganhos pessoais. É o primeiro item do código de ética da categoria, que norteia todos os outros”, afirma Andrea Moufarrege, presidente do Conselho de Ética da Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros.

Outros pontos de atenção são postura isenta ao aconselhar produtos financeiros, transparência quanto a comissões e competência técnica. “Se tiver dúvida, o cliente deve perguntar de novo. Se o profissional responder de maneira insuficiente, pode ser um sinal amarelo”, afirma. “É um mercado complexo, mas, nos últimos anos, tem existido abertura na comunicação e no acesso a informações, por conta de plataformas digitais e de mídias sociais. É positivo. Por outro lado, não existe um remédio que funcione para todas as doenças, por isso a necessidade de procurar um plano sob medida e escolher profissionais reconhecidos por entidades comprometidas.”