Na história recente do Brasil, o tema governança corporativa ganhou espaço nas empresas, reforçado, sobretudo, pelas pressões regulatórias, sociais e de mercado, que, como em qualquer País, interferem nos valores,nos princípios e nos modelos de boas práticas e de transparência de gestão. Um número crescente de organizações empenha-se na busca de informações e treinamento para implementar essas boas práticas de conduta e aprimorar a transparência de seus sistemas de gestão.

É o que demonstra a terceira edição da pesquisa Nível de Maturidade de Compliance das Organizações Brasileiras, realizada neste ano pela consultoria Protiviti. Segundo Heloisa Macari, sócia-diretora da empresa, 45% das companhias brasileiras que participaram do estudo possuem baixo índice de boas práticas de governança, assumem a dificuldade, mas buscam caminhos para melhorar sua estrutura.

“Empresas que levam a sério a governança e a ética são promotoras de processos de compliance e de engajamento de todos os níveis e áreas de funcionamento”, afirma Heloisa. “Mas a pesquisa indicou que em boa parte delas é preciso evoluir na maturidade para estruturar o programa de maneira correta.” Segundo a executiva, essas empresas fizeram uma primeira implantação de instrumentos e ações, como a criação de códigos de conduta, canal de denúncia, análise de risco. “Agora, estão percebendo que esse é apenas um primeiro passo e, na prática, essa estrutura requer ações todos os dias para fortalecer-se e frutificar”, frisa a consultora. Nesse aspecto, lembra, são considerados todos os mecanismos, tanto de incentivos como de monitoramento, que assegurem os princípios de transparência e equidade, a prestação de contas e a responsabilidade corporativa, visando o melhor interesse da empresa e suas obrigações perante a Justiça.

Para o especialista em governança, risco e compliance André Castro Carvalho, sócio-coordenador do escritório Braga Nascimento e Zilio Advogados, a dificuldade envolve duas questões: governança e compliance. “Houve uma corrida para as empresas se adaptarem por conta da Lei Anticorrupção (nº 12.846/13), que prevê a responsabilização no âmbito civil e administrativo de companhias que praticam atos lesivos contra a administração pública”, diz. No entanto, isso não necessariamente se replica em governança corporativa. Adotar regras de compliance sem uma mudança de mentalidade na gestão de uma empresa não traz resultados.

A exceção, segundo Castro Carvalho, são as empresas fiscalizadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que seguem o Código Brasileiro de Governança Corporativa — Companhias Abertas. O documento aborda questões-chaves de governança, como a estrutura acionária, a composição da administração e da diretoria, os órgãos de fiscalização, controle e ética e conflito de interesses. O código segue o modelo “pratique ou explique”, ou seja, não obriga a companhia a adotar as recomendações, mas exige que ela justifique o motivo.

Outra pesquisa, realizada pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) neste ano, demonstrou que apenas 17% das empresas estatais com ações listadas na B3 estão nos segmentos de maior exigência de práticas de governança corporativa (Nível 2 e Novo Mercado). O levantamento se baseia em aspectos como estrutura do conselho de administração, práticas de remuneração, perfil de conselheiros e mecanismos de conduta. O resultado mostrou que os conselheiros independentes representam apenas 11% dos membros desses órgãos nas companhias. Além disso, em 36% das empresas estatais listadas não foram identificados mecanismos formais para gestão de riscos.

Para o presidente do Conselho de Administração do IBGC, Emilio Carazzai, o resultado não precisa ser visto de forma negativa. “Tivemos um grande avanço na questão da governança. Agora precisamos enfrentar questões estruturais, inclusive de cultura, que já estão sendo percebidas pelas novas gerações.”

Novo modelo de gestão da Petrobras

Aprovado pelo Conselho de Administração em janeiro do ano passado, o novo modelo de governança e gestão da Petrobras já está dando frutos. Em agosto, a Petrobras recebeu a certificação no Programa Destaque em Governança de Estatais, no programa da B3 criado com o objetivo de incentivar as empresas públicas a aprimorar suas práticas. A adesão ao programa, cujo regimento entrou em vigor em maio deste ano, está alinhada à Lei nº 13.303/16 (Lei das Estatais), que estabeleceu o estatuto jurídico das empresas estatais no que se refere a boas práticas de governança, integridade, compliance, regramentos societários, das licitações e contratações de bens e serviços.

Para ser certificada, a Petrobras atendeu a todas as medidas obrigatórias e, em relação às adicionais, obteve 56 pontos em um total de 60. Por exemplo, a companhia vem adotando, desde o ano passado, medidas para cumprir diretrizes sobre a composição do Conselho de Administração, da Diretoria Executiva e do Conselho Fiscal, como a diversidade de experiências e qualificações. Incorporou também uma política para indicação de representantes da alta administração, que vai além das exigências previstas na Lei das Estatais, incluindo experiência em cargos de direção superior e reputação ilibada.

Além disso, a Petrobras está aguardando resposta ao pedido de adesão da companhia ao segmento especial de listagem Nível 2 de Governança Corporativa da B3. Esse passo reafirma o compromisso da empresa com a contínua melhoria. “É um dos segmentos mais elevados de governança corporativa da B3, e suas obrigações e requisitos vão além daqueles previstos na Lei das Sociedades Anônimas e na Lei das Estatais”, afirmou a gerente executiva de relacionamento com investidores da empresa, Isabela Carneiro da Rocha.

O novo modelo tem como base melhorar a distribuição e o compartilhamento das decisões. Entre as ações estão o estabelecimento de competências individuais para os diretores executivos e membros do Conselho de Administração, a eliminação das alçadas individuais para um conjunto de decisões, a criação de comitês técnicos estatutários, e a ampliação das atribuições dos demais comitês de assessoramento ao Conselho de Administração e à Diretoria Executiva.

A implantação desse modelo será realizada gradativamente, em “ondas”, de forma a mapear as diversas competências da organização e os processos associados às principais atividades da cadeia de valor da companhia. Nesta nova estrutura, as atividades de natureza corporativa, antes dispersas em várias áreas, serão aos poucos centralizadas. Isso proporcionará economia de custos, otimização de processos, ganhos de escala e maior controle e eficácia dos resultados.