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IPI

Reforma tributária é chance de corrigir assimetrias no imposto sobre bebidas

Cerveja paga menos que itens essenciais, como alimentos e material de construção

Gesner Oliveira (FGV): tratamento tributário desigual para iguais naturalmente gera distorções

O bem-estar social é diretriz para as políticas públicas na maioria dos países. No Brasil, essa prioridade nem sempre parece ser alcançada na tomada de decisão dos governos, pelo menos no que diz respeito às questões tributárias. É o que demonstra um estudo inédito apresentado na Fundação Getulio Vargas (FGV) na última segunda-feira, em São Paulo, sobre a atual estrutura tributária do País, tendo como foco a indústria brasileira de bebidas, cujo faturamento em 2018 somou R$ 135 bilhões.

O relatório destaca que o atual modelo tributário do setor tem sido a origem de diversos efeitos nocivos para a economia, desde a concorrência desleal até a queda na arrecadação da União.

As distorções mais expressivas estão na cobrança da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) no mercado de bebidas alcoólicas, atualmente em benefício das cervejarias. Os subsídios de tributação na cerveja passaram a ser tão favoráveis a ponto de que itens considerados essenciais, como alimentos, tenham hoje alíquotas maiores do que as cobradas das cervejarias – cujo IPI atual é de 6%, bem abaixo do que o praticado para bolachas ou biscoitos (10%) e até para os tijolos da construção civil (8%).

“Poucos setores da economia foram agraciados por desonerações tão significativas quanto a do IPI da cerveja dentro da política de campeões nacionais implantada no governo Dilma Rousseff”, alerta o professor titular da FGV, Gesner Oliveira, responsável pelo relatório, que aponta que a atual lógica de tributação produziu forte desigualdade concorrencial em benefício das cervejarias.

Os dados do relatório apontam que hoje há uma diferença de 24 pontos percentuais das alíquotas aplicadas para as cervejas quando comparadas com as de bebidas destiladas, por exemplo. Segundo Gesner, as assimetrias de alíquotas tornaram-se tão altas que levaram à derrubada da arrecadação do governo. Em todos os anos o recolhimento do IPI do setor foi menor do que em 2014, ano imediatamente anterior à mudança decretada por Guido Mantega, ministro da Economia na gestão Dilma.

De acordo com o estudo, a alta concentração em cervejas no mercado de bebidas alcoólicas – responde por quase 90% do consumo do setor – caracteriza-se como um quadro de competição predatória que deve contribuir para retirar fabricantes do mercado, trazendo outros efeitos econômicos e sociais, como a redução de postos de trabalho.

Na esteira da perda do faturamento e da redução dos níveis de arrecadação, o documento aponta o estímulo à informalidade no setor. De acordo com dados da Euromonitor, o “marketshare de ilegalidade” no Brasil já é maior do que o de todas as bebidas. A única exceção é justamente da cerveja — a bebida que responde por 87% do mercado. Dos 11 mil produtores nacionais de cachaça, por exemplo, apenas 1,5 mil têm atualmente o devido registro legal. Isso evidentemente leva à perda de arrecadação de impostos a riscos à saúde, em função da produção em condições fitossanitárias desconhecidas; e ao aumento da criminalidade.

O estudo da FGV conclui que há oportunidade para ajustes na taxação no setor de bebidas alcoólicas sem aumentar a carga total de tributação, ao contrário do que frequentemente se diz. E que o caminho mais justo e matematicamente prudente seria o da redução das assimetrias — senão o da adoção de uma isonomia tributária. Isso garantiria a competitividade entre empresas e produtos, desestimularia a ilegalidade e beneficiaria a sociedade em geral.

“Encontramos graves distorções no modelo tributário do setor que, sendo corrigidas, podem viabilizar novas modelagens para o IPI dos produtos de chamada externalidade negativa que tragam elevação na arrecadação federal, sem ter como contrapartida o aumento da carga geral dos tributos que, aliás, é a meta do ministro Paulo Guedes”, diz Gesner.

Para ele, pela primeira vez em décadas, os poderes Executivo e Legislativo acordaram sobre a urgência de encaminhar uma reforma da nossa estrutura tributária. “Trata-se de uma chance única e preciosa para que o País possa corrigir assimetrias que têm prejudicado a economia e a sociedade de um modo geral”, diz o economista.

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