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Estadão Blue Studio

Lei das Estatais reforça mudança cultural

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15 de agosto de 2017

Pouco mais de um ano após a publicação da Lei de Responsabilidade das Estatais (lei nº 13.303, de 30/06/2016), percebe-se, sobretudo entre as companhias de grande porte, uma mobilização quanto ao cumprimento das novas regras, o que tem promovido uma mudança cultural neste segmento.

“Embora a lei estabeleça o prazo de 24 meses para implementação, praticamente todas as estatais de grande porte encontram-se adaptadas às novas exigências, principalmente, as regras para nomeação de diretores e membros nos conselhos de administração”, declara Guilherme Lockmann, sócio da área de Risk Advisory da Deloitte. Ele complementa: “esta lei foi um passo importante para maior governança das estatais. Sem dúvida, o maior motivador para sua publicação foram as denúncias de corrupção no País”.

Lucia Casasanta, diretora de Conformidade e Gestão de Riscos da Eletrobras e membro do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) concorda, destacando como principal benefício o ganho de transparência nas indicações para os cargos de dirigentes e conselheiros das estatais. “Os requisitos previstos para ocupantes de cargos de Diretoria e Conselhos não impedem as indicações políticas, mas garantem que os indicados tenham experiência técnica compatível com o cargo”, explica.

“Claramente, vejo a redução da interferência política nessas empresas, pois há critérios mais rígidos a serem seguidos. Pessoas com capacitação técnica passaram a ter maior espaço na organização para assumir responsabilidades”, pondera Lockmann. “A implementação da lei facilita que investidores de outros países possam aportar recursos no Brasil, já que reduz o risco em relação ao nosso mercado, demonstra transparências das informações e uma estrutura de governança mais robusta, favorecendo o desenvolvimento de projetos de infraestrutura”, afirma Elias de Souza, diretor de Infraestrutura e Setor Público da Deloitte.

Outro aspecto importante da lei, na visão de ambos, é o fortalecimento da função de compliance, com exigência de reporte ao Diretor Presidente e com autonomia de acesso direto ao Conselho de Administração. Em contrapartida, Lockmann explica que a Lei das Estatais fala sobre a contratação dos profissionais, mas não aborda o desempenho, a continuidade deste profissional na empresa e sua trajetória. “Outras legislações vão precisar dar maior transparência na valorização do servidor”, comenta.

Para Lucia Casasanta, o destaque negativo é o fato de ser necessário existir uma lei para garantir a adoção de boas práticas de governança nas empresas estatais. “A criação de uma cultura ética e de integridade não vem, necessariamente, do acionista controlador, princípio básico do compliance, o ‘tone at the top’ (que pode ser definido como: o exemplo vem de cima), o que torna mais desafiador ainda o papel do compliance office nas estatais.”

Lockmann destaca que vivemos hoje uma “onda de compliance”, em função de tantos acontecimentos recentes, e que contar com uma estrutura robusta tornou-se uma exigência do mercado, dos órgãos reguladores e dos stakeholders. O executivo alerta, no entanto, a importância dos quatro pilares (compliance, gestão de riscos, controles internos e auditoria interna), lembrando que um pilar não deve ser olhado em detrimento de outro. “Cada um precisa cumprir seu papel. Deve-se destacar as três linhas de defesa (gestores – órgãos de gestão – auditoria interna), conceito que tem sido um catalisador de mudanças.”

Resultados práticos

Na visão de Lockmann, olhando-se basicamente para algumas das maiores estatais, pode-se dizer que a Administração hoje está na direção correta. “A percepção é de que foi dada maior autonomia para gestores exercerem seus papéis. As estatais foram objeto de corrupção no País e, hoje, há um grande desafio de recuperar a reputação, fortalecer a marca, conquistar o engajamento dos funcionários e rejuvenescer o quadro de profissionais (as empresas privadas contam com equipes mais jovens).” Na Eletrobras, entre as ações que estão sendo realizadas para fortalecer seu Programa Anticorrupção, está a implantação do Programa Eletrobras 5 Dimensões, com as seguintes diretrizes:

  • Criação de um ambiente propício à ética e à integridade;
  • Análise periódica de riscos;
  • Estabelecimento de normas e procedimentos;
  • Treinamento e comunicação;
  • Monitoramento contínuo do Programa. “Essas dimensões se retroalimentam”, explica Lucia.

Segundo a executiva, as principais realizações do Programa Eletrobras 5 Dimensões, até o momento, são: atualização do Código de Ética e Conduta das Empresas Eletrobras; avaliação de riscos de fraude nos negócios de geração, transmissão e distribuição; implementação da política de consequências e redesenho do processo de Gestão e Tratamento de Denúncias; redesenho do processo e atualização da Política de Segurança da Informação; implementação de due diligence de integridade para fornecedores e inclusão do componente ‘Integridade’ no regulamento de compras.

Desafios

Lucia Casasanta pondera que o maior desafio está na mudança de cultura da organização, por se tratar de um processo de longo prazo, que exige o envolvimento de todos os atores e a construção passo a passo, lembrando que os resultados, muitas vezes, não são percebidos de modo imediato. “Cabe à função de compliance capitanear esta mudança, com foco no interesse público e objetivos estratégicos alinhados aos propósitos de ética e integridade.”

Entre os mecanismos de defesa adotados pela companhia, ela cita a mudança no processo de Gestão e Tratamento de Denúncias – com a contratação de um canal de denúncia externo e independente -, e a centralização da gestão na apuração, remediação e responsabilização por fraudes e irregularidades das empresas. “Trata-se de um passo importantíssimo para a defesa efetiva na luta contra fraude e corrupção na organização. Sabe-se que, contra o conluio, somente a denúncia é eficaz”, pondera.

A força das Estatais no mercado acionário

O Programa Destaque em Governança de Estatais, voltado a estatais abertas ou em processo de abertura de capital, foi lançado pela BM&FBovespa (hoje, B3) em 2015, com o objetivo de incentivar essas empresas a aprimorarem suas práticas e estruturas de governança corporativa.

A adesão ao Programa é voluntária. Em função da Lei das Estatais, o Programa foi reeditado e um novo Regimento foi divulgado em 11/05/2017. Segundo a B3, o aprimoramento das práticas de governança corporativa propicia condições para uma “precificação” mais precisa dos valores mobiliários, com importantes implicações relativas à redução do custo de capital e à geração de valor às próprias companhias, aos controladores e aos investidores.

Segundo dados da B3, em 31/08/2015, havia 30 Estatais listadas na B3, das esferas federal, estadual e municipal, atuantes em seis setores da economia e responsáveis por 14,23% da capitalização de mercado (equivalente a R$ 300 bilhões). Essas companhias foram responsáveis, no período de setembro de 2014 a agosto de 2015, por 21,9% do Volume Médio Diário Negociado (equivalente a R$ 1,5 bilhão). Dessas Estatais, 8 são integrantes do Ibovespa e 10 são integrantes do IBrX-100.

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