Revista SIM

01 de outubro de 2018

Rodovias que salvam vidas

Ferimentos e mortes provocados por acidentes de trânsito são um problema global. A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que, a cada ano, 1,25 milhão de pessoas perdem a vida no mundo por causa deles. No Brasil, são cerca de 40 mil vítimas fatais, segundo dados do DPVAT – o seguro obrigatório dos veículos. Para enfrentar esse mal, a ONU lançou um desafio aos seus países-membros: reduzir os acidentes e as mortes pela metade de 2011 a 2020, iniciativa batizada como Década de Ação pela Segurança no Trânsito.

O Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer, mas alguns resultados começam a aparecer. Pelos dados mais recentes, o País apresenta estatística de 18 vítimas fatais para cada 100 mil habitantes por ano, índice 25% melhor do que em 2010. Poderia ser melhor. A Espanha, por exemplo, conseguiu diminuir o número de fatalidades em 64% em um período de onze anos.

Mas existem rodovias brasileiras com resultados próximos a esses, que passaram a ser administradas pela iniciativa privada. São Paulo é um exemplo. Segundo a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado (Artesp), entre 2010 e 2015, o número de vítimas fatais caiu 51% em quase 7 mil km de rodovias sob concessão. E o fenômeno se repete em outros estados. A explicação está nos investimentos que as concessionárias vêm fazendo nas rodovias, que já totalizam R$ 178 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Concessionárias de Rodovias (ABCR). 

As perspectivas para o futuro também inspiram otimismo. Novas tecnologias, como a transmissão de informações em tempo real por veículos conectados, câmeras, radares, aplicativos, drones e outros equipamentos modernos, prometem melhorar muito o controle de tráfego das ruas e rodovias nos próximos anos. A fiscalização ficará muito mais eficiente e, com o auxílio também das sempre tão importantes campanhas educativas, deve engendrar uma transformação profunda no comportamento dos motoristas, fator responsável por acidentes de trânsito.

A seguir, você fica sabendo mais sobre iniciativas recentes ou que serão adotadas nos próximos anos para aperfeiçoar a fiscalização, mudar as atitudes dos motoristas e melhorar a segurança do trânsito no Brasil.

Para ter um trânsito mais seguro

Especialistas apontam quais são os fatores mais importantes para reduzir acidentes e fatalidades nas rodovias

Melhorar a segurança no trânsito dá trabalho, mas o caminho é conhecido.  De acordo com os especialistas, ele envolve alguns fatores, como a colaboração entre órgãos públicos, instituições de pesquisa, empresas privadas e organizações não governamentais.

No campo tático, é preciso executar bem três tarefas fundamentais: reunir a maior quantidade possível de informações sobre os acidentes, analisar suas causas com olhos voltados à busca de soluções e implementar as mudanças necessárias.

Também é essencial estabelecer objetivos e prazos para atingi-los. “As metas permitem monitorar a extensão dos avanços e facilitam a cobrança pela sociedade”, afirma Victor Pavarino, consultor em segurança no trânsito da Organização Mundial de Saúde (OMS).

A vontade de mudar foi um dos ingredientes fundamentais do sucesso da Espanha, que conseguiu reduzir em 64% as fatalidades no trânsito entre 2004 e 2015. Quem conta é o diretor- -geral de Tráfego do país, Pere Navarro Olivella. “Em 2004, pela primeira vez, a segurança rodoviária estava na agenda de todos os partidos políticos da Espanha. Então, apostamos na conscientização para que todos os cidadãos soubessem da magnitude da catástrofe”, relata.

 

Somos todos responsáveis

Flávio Tavares, fundador do Instituto Parar, voltado à segurança viária no Brasil, concorda: “Precisamos criar um ambiente onde todos se sintam um pouco responsáveis pelos números alarmantes, para conseguirmos fazer mais ações coordenadas entre poder público, organizações não governamentais e iniciativa privada”.

Segundo os especialistas, a concessão à iniciativa privada tem sido um fator importante para a melhoria da qualidade e da segurança das estradas. A Confederação Nacional dos Transportes realiza anualmente uma pesquisa em que especialistas em infraestrutura e engenharia viária percorrem 105 km de rodovias para avaliar suas condições. Na edição mais recente, as vias sob gestão pública receberam 29,6% de classificação “boa” ou “ótima”. Nas concessionadas, esse índice foi de 74,4%.

A cooperação entre órgãos públicos, empresa privadas e outras instituições da sociedade civil vem ganhando força no Brasil. Há projetos que unem municípios, governos estaduais e companhias que atuam no setor de transportes em ações como o compartilhamento de informações e estudos sobre as causas de acidentes, campanhas educativas, melhorias em sinalização, planos de sinalização, entre outras. Um projeto dessa natureza, realizado em São Paulo, reduziu em 7,2% as vítimas fatais no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2017 – o que representa 600 vidas salvas.

A coordenadora do trabalho, Sílvia Lisboa, explica que uma das iniciativas mais importantes do grupo foi reunir as informações sobre acidentes geradas por diversas fontes, como Polícia Civil, Polícia Militar e Polícia Rodoviária Federal. “Contar com uma boa base de dados é fundamental para começar a pensar em ações”, pondera.

A opinião é compartilhada por David Braunstein, presidente da organização Together for Safer Roads (TSR), que atua mundialmente em projetos para melhorar a segurança nas rodovias. “Para agir, é preciso ter primeiro uma compreensão clara das causas dos problemas”, ele afirma. 

Uma parte importante do trabalho de melhorar a segurança no trânsito consiste em mudar comportamentos perigosos praticados por motoristas e pedestres. Outro conjunto de medidas diz respeito às intervenções que podem ser feitas no sistema viário. O especialista Pere Navarro dá alguns exemplos: “Se separarmos bem as vias de circulação, evitaremos choques frontais. Se removermos os obstáculos de concreto ou pedras e árvores nos canteiros, impediremos que as pessoas se matem caso percam a direção e o veículo saia da estrada. Se fizermos passagens para pedestres, evitaremos muitos abusos. Se cuidarmos das proteções de pista, evitaremos colisões laterais”.

Um projeto realizado recentemente em Xangai, na China, com a participação da TSR, reduziu o número de acidentes em 25% e as mortes, em 80%, por meio de intervenções dessa natureza. Elas também compõem o leque de ações do projeto Segurança Viária Global que a Bloomberg Philanthropies vem realizando desde 2015 em cidades de dez países em desenvolvimento, incluindo São Paulo e Fortaleza.

Vontade de mudar, união de esforços, decisões baseadas em dados, definição de metas, intervenções nas rodovias, campanhas de conscientização, fiscalização rigorosa. A união de todos esses fatores, segundo os especialistas, é o melhor caminho para um país melhorar seus índices de segurança no trânsito. Não existem atalhos.

 

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